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Foto do escritorMarcio Cruz

O PAPEL DA IMAGINAÇÃO NA TRM

Atualizado: 22 de jul.

Poucos conceitos são tão mal compreendidos no mundo moderno quanto aquele representado pela palavra "imaginação". Nossa cultura carrega um enorme preconceito contra a imaginação, haja visto as frases que normalmente utilizamos como “você está apenas imaginando coisas” ou “isso é apenas imaginação e não realidade”, conferindo à palavra imaginação o sentido de algo irreal, fictício, desimportante ou inexistente. Mas ficaríamos extremamente surpresos ao entender o jeito que os nossos antepassados lidavam com esse conceito, colocando de lado o ilusório senso de inferioridade que nós normalmente nutrimos pelos povos antigos.


Terapia Regressiva de Vidas Passadas

A raiz da palavra imaginação vem do latim “imago”, que significa “imagem”. A própria palavra fantasia possui raiz no grego "phantasía". E o significado original desta palavra é bastante instrutivo, posto que ela deriva de um verbo que significa “tornar visível” ou revelar”. E a correlação aqui é clara: a função psicológica de nossa capacidade de fantasiar é tornar visível a dinâmica que, de outra maneira, seria invisível para a esfera consciente. E assim encontramos na psicologia dos gregos um insight fundamental que a psicologia moderna precisa redescobrir: a mente humana é investida de um poder especial para converter o reino invisível em formas visíveis para que possam ser observadas em nossa tela mental.

Esse reino invisível é o inconsciente, domínio que, para Platão, era o mundo das formas ideais. Outros antigos consideravam a imaginação como a esfera dos deuses ou a região do espírito puro. A palavra phantasía, por outro lado, denotava essa faculdade especial da mente para produzir imagens poéticas, abstratas e religiosas. A phantasía era a capacidade de “tornar visível” os conteúdos do mundo interior, dando-lhes forma ou personificando-os. Os gregos consideravam como garantida a realidade do universo interior, o qual era expresso como formas ideais ou qualidades universais que se revestiam com as imagens divinas de seus deuses. Para eles, a phantasía era o órgão psíquico através do qual o mundo divino conversava com a mente humana.

O renomado psiquiatra suíço Carl Jung entendia a imaginação como uma forma de acesso à dimensão do inconsciente. Para ele, o sonho e a imaginação tinham uma qualidade especial em comum: o poder de converter as formas invisíveis do inconsciente em imagens perceptíveis à mente consciente. Desta maneira, nós poderíamos entender que sonhar seria a imaginação trabalhando durante o sono e a imaginação seria o mundo dos sonhos fluindo através de nós enquanto estamos acordados.

Assim como o inconsciente transborda durante a noite, criando padrões na tela da mente onírica, o inconsciente também funciona durante as horas de vigília. Ele emite um fluxo contínuo de pulsos que chegam à mente consciente na forma de sentimentos, humores e, acima de tudo, das imagens que aparecem na imaginação. Ou seja, muito das sensações, emoções, sentimentos, pensamentos de fantasia (em oposição ao pensamento dirigido) e imagens (imaginação) teriam origem no inconsciente, resultando em uma forte influência em nosso comportamento que está muito longe da razão. Embora a crença de que o ser humano seria uma animal racional seja por demais popular, esta é uma das falácias mais facilmente refutadas pela experimentação empírica de uma espécie que justifica seu comportamento irracional com alegações racionais.


De forma análoga aos sonhos, os significados simbólicos das imagens em estado de vigília podem ser compreendidos pela pessoa que esteja engajada no aprendizado. O material que flui através da imaginação assume muitas formas, desde as mais fúteis até as formas visionárias. Na base desta escala está a fantasia passiva: este é o devaneio fantasioso que passa pela mente em momentos estranhos durante o dia ou às vezes nos distrai por longos períodos de tempo. Tais fantasias são meros entretenimentos ou distrações que nada acrescentam à consciência. No topo da escala está a experiência visionária, na qual se fundem a Imaginação Ativa e a experiência religiosa. A Imaginação Ativa foi uma técnica criada pelo próprio Jung como forma de ter acesso ao universo do inconsciente e assim promover a integração com a porção consciente dominada pelo ego (esfera racional).

Enquanto fenômeno da consciência, não podemos negar que a imaginação existe como um estado em potencial. Havendo uma correspondência viável com a matriz física local (condições biológicas, contextuais, econômicas, tecnológicas, etc.), a probabilidade de a imaginação ser concretizada passa a ser muito grande.

Entendendo a livre associação da palavra imaginação com o termo “imagem em ação”, ela poderia ser conceituada como a nossa capacidade consciente de criar narrativas ou histórias em nossa mente. A mentira também envolve a nossa habilidade consciente para criar conteúdo mental, mas com o intuito de enganar os outros ao ser comunicado. E a ilusão tende a ser uma forma de auto engano ou de equívoco coletivo (não intencional), a qual pode ou não pode ser comunicada com os outros ao nosso redor.

A maior de todas as ilusões é definida pela filosofia hinduísta como Maya: a ilusão cósmica de que o mundo fenomênico é real. E se o mundo fenomênico como consequência da mente é de fato uma ilusão, seria a imaginação, como parte da fonte de tudo o que existe no universo, a derradeira realidade?

Por questões de limites dos sentidos físicos, da capacidade de processamento de informações e da lei da economia de energia, Maya acaba sendo um conceito plenamente compatível com as pesquisas científicas atuais envolvendo a teoria da evolução das espécies e a teoria dos jogos. Ou seja: não enxergamos a realidade da forma como ela é e sim da maneira que favoreceu a nossa sobrevivência no ambiente terrestre, uma vez que o pleno acesso a tudo que existe nos deixaria perdidos e seríamos presas fáceis de um animal selvagem ou cairíamos facilmente de um penhasco, sobrecarregados que estaríamos diante de tantos estímulos externos. E enxergar esse contexto de limitação sensorial como a totalidade de tudo aquilo que existe constitui um dos níveis de entendimento do conceito de Maya.

A verdade é que a imaginação tem sido uma propriedade mental muito útil para o nosso bem-estar e para o desenvolvimento do tecido social no universo tridimensional. Sem a imaginação, o Homo Sapiens jamais teria chegado onde chegou, construindo inúmeras camadas de ficções convenientes que nos diferenciam de todos os outros animais e estruturaram aquilo que chamamos de civilização. E paradoxalmente, a imaginação como capacidade para construir narrativas com o potencial de influenciar o contexto externo ainda sofre o menosprezo de uma cultura que enfatiza a conformidade, estrangula a criatividade e cultua a aparência física.

Quase tudo aquilo de bom e de ruim que existe no mundo surgiu de nossa imaginação, ficando patente o quão esquizofrênica é a nossa forma de lidar com a realidade. E assim mutilamos uma enorme parte de nós mesmos ao acreditar na narrativa cultural predominante, encarando a imaginação como algo sem substância ou validade em nosso cativeiro consciencial. E com tantos problemas de escala global assolando o nosso mundo, o incentivo da imaginação e da criatividade em um ambiente de ampla cooperação parece ser o único contexto capaz de garantir a sobrevivência de nossa espécie.

Desta maneira, ao contrário do que sempre pensamos, não existe uma “tabula rasa” em nossa mente. Ninguém “inventa” nada a partir do zero na imaginação, posto que consideramos o ponto de partida apenas aquilo que adentra na porção consciente de nossa mente, ignorando por completo a larga porção inconsciente individual ou transpessoal. Apelando para uma metáfora, seria como viver enclausurado em uma prisão e considerar que tudo tem origem dentro dos perímetros deste presídio, ignorando que o mundo se estende para fora desse cárcere. Por consequência, o material que surge na imaginação advém da porção inconsciente do indivíduo. E o inconsciente individual se mescla de forma orgânica e frequente com o inconsciente coletivo, estando ambas as instâncias inseridas no contexto da consciência cósmica (para maior substanciação deste trecho, sugiro a leitura da postagem O Universo é Mental).

A imaginação na abordagem da TRM se funde com a técnica de regressão de memória, sendo ambas as instâncias formas diferenciadas de entrar em contato com o conteúdo do inconsciente que é de natureza simbólica. Portanto, as vivências não precisam ser necessariamente literais e não precisam ter sido de fato vivenciadas pela unidade consciencial do indivíduo. Ao se mesclar com o inconsciente coletivo, algumas vivências podem ser de terceiros, além de expressarem frequentemente a influência dos arquétipos, outro conceito junguiano que nos coloca em contato indireto com a história de toda a humanidade.

O pensamento mais simplista vai se rebelar contra essas alegações, argumentando que, se o indivíduo não vivenciou uma situação, qual seria a importância daquele evento para ele? O grande problema aqui é que embora o ego tenha a certeza da separação, em um nível mais profundo estamos todos interligados, influenciando e sendo influenciados o tempo todo pelo inconsciente individual e coletivo. E isto é plenamente justificável tanto pelas instâncias subatômicas, ambientais, genéticas, históricas e culturais quanto pelas instâncias psíquicas, havendo toda uma herança que nos faz ser quem nós somos neste exato momento. Ou seja, apesar de nosso ego afirmar categoricamente que é livre, separado e independente do mundo, esta é a maior de todas as mentiras, constituindo a pior expressão do conceito de Maya que um indivíduo poderia abraçar. E se as influências das instâncias psíquicas ainda soam como aspectos pouco convincentes perante as influências físicas supracitadas, sugiro mais uma vez a leitura da postagem O Universo é Mental.

Seria até possível explorar uma vivência de vida passada de forma a saber sobre detalhes que, posteriormente, poderiam ser utilizados para confirmar se o indivíduo realmente viveu aquele contexto. O problema é que isto tira completamente o foco do trabalho, o qual é o de promover a tão esperada cura, não sendo importante ter a certeza se o paciente passou literalmente por aquela história (em um nível de enraizamento psíquico muito mais profundo, todos nós passamos por tudo que já ocorreu no mundo). O ímpeto pela precisão mecânica no entendimento das experiências da TRM é compreensível pela ampla influência do paradigma materialista em nossas vidas. Porém, ela é completamente incompatível com a natureza da consciência, a qual é orgânica, natural, dinâmica, elástica, maleável, porosa, fluídica e imprecisa. Nenhum processo natural é mecânico, milimétrico e preciso: somos parte integrante da natureza e esquecemos disso o tempo todo na camada artificial que a civilização humana criou por cima do reino natural, não sendo nenhuma surpresa o fato de muitos pacientes tentarem interpretar as vivências de forma precisa e determinística e não simbólica. E sair da literalidade para a entrar na simbologia (imagens que apontam para um significado além delas mesmas) é um exercício que o cliente precisará aprender a fazer.

É por esta razão que o nome Terapia por Reintegração de Memórias foi escolhido, posto que estas podem ser de caráter individual ou coletivo. E se estas estão causando algum tipo de transtorno, precisam ser reintegradas como um dia já foram para além de nossas experiências encarnatórias.


 

Marcio Cruz é terapeuta de regressão de memória formado pelo IMMTER - Instituto Mineiro de Medicina e Terapias e pós-graduando em Neurociências e Comportamento pela PUCRS.​ Saiba mais sobre Marcio Cruz na seção O Terapeuta.   Terapia por Reintegração de Memórias - TRM Terapia alternativa na cidade de Jundiaí, SP.


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